Formas de tratamento (1)
26.08.05 | João Manuel Maia Alves
As formas de tratamento na língua portuguesa são qualquer coisa de pavorosamente complicado. Têm variações nacionais, regionais e locais, por vezes com diferenças difíceis de explicar que podem, se não forem tomadas em conta, dar origem a situações embaraçosas ou mesmo deixar pessoas melindradas.
Neste artigo pretende-se dar uma ideia das formas de tratamento em Mouriscas num período que começa um pouco antes de 1950 e abrange uns 30 anos.
Comecemos pelo tratamento dado à autoridade religiosa da freguesia. O Padre Francisco José Pires, que deixou Mouriscas em 1951, era tratado por Senhor Vigário. Também havia quem lhe chamasse Senhor Prior. Parece que algumas pessoas que raramente iam à igreja se lhe dirigiam por Senhor Superior das poucas vezes que tinham de falar com ele. Quando alguém se referia a ele, dizia o Padre Pires, não o Vigário Pires.
A palavra vigário adquiriu com o tempo um mau sentido. Passou a significar vigarista. Parece que o sucessor do Padre Francisco José Pires, Padre João Mendes Pires, falecido em 2004, pediu, quando chegou a Mouriscas, que o tratassem por Padre João. Assim foi sempre conhecido e tratado.
Quem és tu, meu menino?. Sou filho do tio Chico Lopes. Pensava que eras filho do tio Luís do Cardal. Oh tia Maria, a sua família e a minha sempre se deram bem. Fala da casa do tio Manuel Lopes. A tia Joana ainda anda bem apesar da idade. Estas são frases que se podiam e ainda podem ouvir em Mouriscas. Nelas a palavra tio e tia não indicam um grau de parentesco. São mais ou menos equivalentes informais de senhor e senhora.
Mouriscas era uma terra cheia de tios e tias. As duas palavras eram frequentemente usadas com os significados que vimos atrás.
Tio e tia com os significados indicados tinham nuances de aplicação. Talvez uma pessoa perguntasse a outra em Mouricas: O tio Manuel vai hoje a Abrantes?, mas ao falar-lhe noutra terra, no meio de pessoas bem vestidas e de ar citadino, dissesse: o Senhor Manuel não me dava uma boleia?. Um tio em Mouriscas podia ser o senhor noutro ambiente.
Quando uma pessoa tratava outra por tio ou tia sem ser da sua família, isso não queria dizer que fosse mais nova que a outra. As duas pessoas podiam ser de idades aproximadas. Uma coisa era certa em circunstâncias mais cerimoniosas poderia tratá-la por senhor ou senhora.
(Continua)
Autor do artigo: João Manuel Maia Alves
Neste artigo pretende-se dar uma ideia das formas de tratamento em Mouriscas num período que começa um pouco antes de 1950 e abrange uns 30 anos.
Comecemos pelo tratamento dado à autoridade religiosa da freguesia. O Padre Francisco José Pires, que deixou Mouriscas em 1951, era tratado por Senhor Vigário. Também havia quem lhe chamasse Senhor Prior. Parece que algumas pessoas que raramente iam à igreja se lhe dirigiam por Senhor Superior das poucas vezes que tinham de falar com ele. Quando alguém se referia a ele, dizia o Padre Pires, não o Vigário Pires.
A palavra vigário adquiriu com o tempo um mau sentido. Passou a significar vigarista. Parece que o sucessor do Padre Francisco José Pires, Padre João Mendes Pires, falecido em 2004, pediu, quando chegou a Mouriscas, que o tratassem por Padre João. Assim foi sempre conhecido e tratado.
Quem és tu, meu menino?. Sou filho do tio Chico Lopes. Pensava que eras filho do tio Luís do Cardal. Oh tia Maria, a sua família e a minha sempre se deram bem. Fala da casa do tio Manuel Lopes. A tia Joana ainda anda bem apesar da idade. Estas são frases que se podiam e ainda podem ouvir em Mouriscas. Nelas a palavra tio e tia não indicam um grau de parentesco. São mais ou menos equivalentes informais de senhor e senhora.
Mouriscas era uma terra cheia de tios e tias. As duas palavras eram frequentemente usadas com os significados que vimos atrás.
Tio e tia com os significados indicados tinham nuances de aplicação. Talvez uma pessoa perguntasse a outra em Mouricas: O tio Manuel vai hoje a Abrantes?, mas ao falar-lhe noutra terra, no meio de pessoas bem vestidas e de ar citadino, dissesse: o Senhor Manuel não me dava uma boleia?. Um tio em Mouriscas podia ser o senhor noutro ambiente.
Quando uma pessoa tratava outra por tio ou tia sem ser da sua família, isso não queria dizer que fosse mais nova que a outra. As duas pessoas podiam ser de idades aproximadas. Uma coisa era certa em circunstâncias mais cerimoniosas poderia tratá-la por senhor ou senhora.
(Continua)
Autor do artigo: João Manuel Maia Alves